(por Sensei Vilaça
Pinto)
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Jinkaku Kanseini Tsuto Murukoto (Caráter)
Makoto No Michyo Mamurokoto
(Sinceridade)
Doriuoku No Seishin Oyashinaukoto
(Esforço)
Reiguió Omonzurukoto
(Etiqueta)
Keki No Yuó Imashimurukoto
(Auto-controlo)
Se
uns perguntam de que se trata, outros já
o conhecem e, outros ainda, provavelmente
até o dizem no Dojo, no final dos treinos.
O que é realmente importante é
entende-lo, praticá-lo e ensiná-lo.
Genericamente trata-se de um conjunto de cinco
regras, apontando cada uma delas para sentidos
diferentes do comportamento do Karateka. Estas
regras não se destinam apenas a regular
a atitude do praticante durante o treino,
mas também, durante todos os momentos
a sua vida, exterior ao Dojo. Numa altura
em que o Karatê-Dô
é
tão mal entendido e tão mal
tratado, parece-me ser oportuno abordar este
tema. O Karatê-Dô
não deve ser interpretado apenas como
exercício físico, ou uma atividade
que se pratica duas ou três vezes por
semana, no ginásio lá do bairro,
depois do que, tudo se esqueceu e volta a
ser como antes.
HITOTSU
JINKAKU KANSEI NI TSUTOMURU KOTO
(Caráter)
Se o Karatê-Dô entendido
como uma filosofia de vida, significa que
as capacidades adquiridas por este método,
estilo, permanecem presentes no indivíduo
e não apenas quando este se encontra
nas melhores condições físicas
ou no pico da forma. O verdadeiro Karateka
encara uma doença ou uma lesão
como um momento ideal para treinar e sentir
o Karatê-Dô.
É debaixo de grandes dificuldades que
se desenvolvem grandes qualidades de carácter.
O fundador do Karatê-Dô,
Gishin Funakoshi ensinava: "A finalidade
do Karatê-Dô
não reside na vitória ou na
derrota, mas sim, no aperfeiçoamento
do caráter dos seus praticantes".
HITOTSU
MAKOTO NO MICHI O MAMORU KOTO
(Sinceridade)
O Homem do Mundo atual tem revelado, não
nas palavras contidas no discurso teórico-filosófico
acerca das normas por que se diz reger, mas
sobretudo no acto concreto da convivência
social, uma enorme dificuldade em se abstrair
do "parecer" e de valorizar o "ser".
Curiosamente, se colocarmos esta questão
a qualquer pessoa, ou em qualquer lugar, a
resposta é sempre a favor do ser. No
entanto, o que se verifica na prática
corrente do dia a dia é a hipocrisia
do "parecer". O treino de Karate
tem de ser um acto de sinceridade que nos
torne humildes nas facilidades e corajosos
nas dificuldades. Esta é a única
maneira de evoluir em Karatê-Dô
e de entender o "Oss". A falta de
sinceridade evidenciada pelos competidores,
produto duma instrução distorcida,
aconselhada pelos próprios instrutores,
desprovida dos mais elementares princípios
do Karatê-Dô,
leva, pouco a pouco, ao abandono da modalidade
pelos praticantes que se sentem enganados.
Por outro lado promover e divulgar provas
desportivas de Karatê-Dô
com muita qualidade, é o mesmo que
dizer às pessoas para não praticarem
Karatê-Dô.
Que nos vale exibir o cinto ou a taça
do nosso desejo, se uma prática dura
e rigorosa do treino, esse adorno sito quem
mais nos envergonha. De que nos vale "parecer"
se não conseguimos "ser"
? ... É para dizermos nos jornais e
aos amigos que somos? ... E a nós o
que dizemos ?
HITOTSU
DORYOKU NO SEISHIN O YASHINAU KOTO
(Esforço)
O treino de Karatê-Dô,
não obstante de ser um excelente exercício
físico, é sobretudo um método
de educação do corpo. No entanto,
devemos ter sempre presente que não
é no corpo que se governa a vida. Nesse
sentido assume especial relevo o desenvolvimento
do espírito em apelo às capacidades
evolutivas - o esforço. Esta que é
a terceira das cinco máximas do Karatê-Dô,
é a que mais frequentemente se interpõe
entre o treino e o praticante. Porém,
o culto do esforço não terá,
em Karatê-Dô,
o mesmo significado que no desporto em geral.
Nos desportos tradicionalmente ocidentais,
o esforço é uma componente do
treino para aquisição da condição
física e do rendimento desportivo.
Isto significa que, o desportista só
vale quando a sua condição física
o coloca no pico da forma. Em Karatê-Dô,
o esforço tem o significado do confronto.
É sob as grandes dificuldades que se
revelam algumas características do
indivíduo, ocultas na sua personalidade,
quantas vezes sem ele mesmo as conhecer. Nas
atividades desportivas procura-se que, o esforço
para vencer a fadiga apareça o mais
tarde possível, ou de preferência
que nem se faça sentir. Esta é
a forma ideal do "atleta". No Karatê-Dô,
procura-se o confronto do Karateka com a fadiga.
Quantas vezes são revelados métodos
científicos para a aquisição
da forma? Este facto é por vezes referido
pelos metodólogos do desporto como
errado. Eles porém, desconhecem que
este é um dos princípios essenciais
que caracterizam as artes marciais.
HITOTSU
REIGI O OMONZURU KOTO
(Etiqueta)
Sendo o Karate uma modalidade que nos proporciona
a aprendizagem de movimento e técnicas
de grande poder e eficácia, susceptíveis
de provocarem danos quando aplicadas no corpo
humano, não se concebe a dispensa da
etiqueta e o culto das boas maneiras, como
factor regulador nos ímpetos agressivos
e violentos. Não sendo assim, o Karatê-Dô
torna-se uma prática rude e rudimentar,
à semelhança do que acontece
em alguns desportos de competição,
com a agravante de que, neste caso, se trata
de uma arte marcial, isto é, de movimentos
de ataque e defesa. A confirmar os meus receios,
temos a forma grosseira como a competição
trata o Karate. Assistir hoje a uma competição
de Karatê-Dô,
salvo raras excepções, é
um espectáculo decepcionante. A falta
de qualidade técnica e ética,
invariavelmente de mãos dadas, começa
nos competidores alastrando-se até
ao público assistente, passando pelos
árbitros e pelos instrutores responsáveis
pelas ações em disputa. É
realmente um mau espectáculo e sobretudo
não dignifica a modalidade.
HITOTSU
KEKKI NO YU O IMASHIMURU KOTO
(Auto-controle)
Qualquer uma das três disciplinas que
compõem o treino de Karatê-Dô:
Kihon, Kata ou Kumite, nos relaciona com as
cinco máximas. No entanto, o treino
de Kumite confronta-nos não apenas
connosco, mas também com o nosso opositor.
Nesta disciplina o praticante é intérprete
na encenação de uma luta pela
sobrevivência, durante a qual é
avaliado e educado, pela exposição
do seu instinto natural genérico e
cultural. A sobrevivência é talvez
a motivação mais forte no ser
humano, causa do empenho e dos exageros a
que frequentemente assistimos na sociedade
actual. Não raro, actos irreflectidos
tomam o lugar da razão e do discernimento,
numa clara perda de auto-controlo. A história
das artes marciais está cheia de referências
de grandes Mestres, que nos herdaram com os
seus pensamentos e actos. Um dos maiores mestres
de Iaido do Séc. XIX, outrora temido
Samurai, era conhecido pelo rigor e exigência
com que ministrava os treinos aos seus discípulos.
Antes de morrer, deixou as suas armas pessoais
ao seu aluno mais graduado, juntamente com
um livro das suas memorias intitulado: "O
melhor e mais valente samurai é aquele
que ganha o combate sem ter de desembainhar
o sabre". O fundador do Aikido - Mohrei
Ueshiba dizia " O melhor lutador é
aquele que mata o combate à nascença."
o que equivale a dizer que o combate cessa
antes de ter começado. Esta filosofia
de interpretar e cultivar as artes marciais,
revela uma forma superior de estar em sociedade
e de profundo respeito pela individualidade
humana. Só assim compreendemos a razão
da saudação ao Dojo quando dele
saímos. É o respeito pelo local
onde aprendemos, pelos companheiros de treino
e pelo "Sensei" e também
pelo nosso esforço, através
do qual aprendemos a conhecermo-nos melhor.
Não deixemos morrer o Karatê-Dô...
Não matemos o Karatê-Dô...
Voltemos ao passado. Voltemos ao Karatê-Dô
tradicional... Voltemos ao DOJO KUN.